332 - Um pouco da História esquecida do pano de CHITA

Até hoje não foi ainda possível desvendar o mistério que rodeia a criação do pano mais usado pelas classes trabalhadoras nos séculos passados, a CHITA.
A origem deste pano de algodão, é disputada por pelo menos quatro países, a Chita de Alcobaça em Portugal, com os seus grandes estampados de flores e cornucópias, o Algodão Indiano, o Chitão do Brasil e, por fim o Liberty da Inglaterra, de flores miudinhas.
De acordo com o que consegui apurar, a primeira manufactura de impressão sobre algodão, em Portugal, nasce da associação de um inglês com um holandês em 1690, no entanto, a primeira fábrica de panos em Alcobaça, só foi fundada em 1774 a qual passa em 1779 para a Junta de Administração das Fábricas do Reino.
Em 1875 é fundada a Companhia de Fiação e Tecidos de Alcobaça, que irá sobreviver até meados do século XX.
No entanto já no (séc XV) Gil Vicente, na Farsa dos Almocreves, faz referência aos panos de Alcobaça na fala de um dos personagens. O Capelão, cujo hábito há muito se encontra esfarrapado, reclama da falta de pagamento de serviços prestados ao Fidalgo, seu amo, que mesmo não tendo condições financeiras quer manter as aparências. Assim o Fidalgo enganando tudo e todos com falsas promessas de lhes arranjar trabalho no Paço, vai evitando pagar aos seus serviçais.
Dizia então o capelão:
...................................................
E vós fazeis foliadas
E não pagais ó gaiteiro?
Isso são balcarriadas.
Se vossas mercês não hão
Cordel pêra tantos nós,
E não comprei gavião,
Pois que não tendes pios.
Trazeis seis moços de pé
E acrecentai-los a capa,
Coma rei, e por mercê
Não tendo as terras do Papa
Nem os tratos de Guiné,
Antes vossa renda encurta
Com ós panos d’Alcobaça
…………….............……………..
Que quer dizer mais ou menos isto: "E vós fazeis festas e não pagais aos músicos, isso é persunção. Se vós não tendes dinheiro para que haveis de ter seis criados a quem tendes que pagar, se não tens terras como o Papa, nem os rendimentos da Guiné e pelo contrario o vosso dinheiro encolhe como os panos de Alcobaça"
Este algodão, que encolhia ao lavar, servia não só para a confecção de reposteiros, colchas ou cobertas de cama, toalhas de mesa, era usada também no vestuário feminino, em especial nos aventais e camisas de trabalho. Eram também de chita os talégos, onde os trabalhadores levavam a merenda para o campo e, não havia quem não tivesse um taléguinho para o dinheiro.
Ora a que vem toda esta conversa?
Primeiro porque é uma parte da nossa História que a pouco e pouco vai desaparecendo. O pessoal mais novo já não conhece este pano que noutros tempos alindaram os corpos e as casas dos nossos avós.
Quer dizer dos (meus pais) sim, porque na minha juventude a chita ainda era abundantemente usada.
Depois porque achei graça ao concurso de vestidos de chita (em 62 participei num) que teve lugar em Coimbra ganho por uma jovem de 100 anos.
Os meus parabéns e que para o ano seja de novo a vencedora.

8 comentários:

Manuel Seleiro disse...

Bom dia,
Olá Susete.
Boas recordações, amiga.
Que dizer da chita da tabela...
Sabes que quando se fala de talegos, as pessoas não sabem do que se trata.
A pergunta o que é isso, de talego?
A minha avó, trazia sempre um talego, pequenino preso a cintura da parte de dentro da saia...
Um abraço, amiga.

Manuel Cataluna
P.S.
Ha! a minha mãe, mandava-me comprar meio metro de chita da tabela, na loja do Ferreira, que ficava na rua das portas de Beja.

Susete Evaristo disse...

Olá Amigo Manuel
Eu ontem quando escrevi este artigo pensei logo que o irias comentar.
Chita da tabela, pois é era esse o nome que nós lhe davamos.
Sabes, foi exactamente para que me perguntassem o que é um talégo que escrevi esse nome e não o outro pelo qual é mais conhecido.
Eu tive vestidos lindos e saias de chita.
Lembro-me bem das blusas de trabalho da minha tia, e das cobertas de cama, que aliás tenho uma guardada, era da minha avó.

Manuel Seleiro disse...

Boa tarde,
Olá Susete.
Então vamos esperar que perguntem, o que é um talego...
Verdade que fazia umas camisas muito bonitas.
E o que dizer dos vestidos, pois as raparigas ficavam lindas...
Recordo com saudade, quando acabava a ceifa e os rapazes com camisas de riscado e as raparigas, trajando com canisas de chita, e na cabeça traziam grinaldas feitas de flores silvéstres, e alguns fruttos da época.
Entrávamos na vila ladiados por os padrinhos, e todo o rancho a cantar..
Ceifeira linda ceifeira...
Manuel Cataluna

Susete Evaristo disse...

É verdade Manuel, assisti muitas vezes da varanda da casa no Largo das Portas de Moura, onde morei, à chegada vindos pela Rua de Santo António, dos ranchos de Ceifeiras, com as mais novas à frente e as suas coroas de flores e frutos como dizes, sinal de que tinham aprendido o trabalho.
Tradições há muito perdidas.

Manuel Seleiro disse...

Boa noite,
Susete posso tirar a foto da ceifeira?
Depois dasme autorização, não dás??
Ha! faltava falar do cotim...
Sim dava para fazer as calças, de trabalho dos homens.
Um abraço, e bom domingo...

Manuel Cataluna

Susete Evaristo disse...

Claro que sim, Manuel, tenho vários postais e as moças que aparecem são de Serpa.
Vou enviar-te poe email mais alguns.

BOGA E AXIGÃ disse...

Talego, acessório indissociável do tarro, hummmmmmmmmm, lembram-me bons petiscos tipo " panito com ovo frito e linguiça, hummmmmmmmmmmmmm.
Um abraço Susete.

Susete Evaristo disse...

Olá amigos Boga e Axigã, pois claro que em grande parte do Alentejo esses dois ícones dos trabalhadores rurais eram dissociáveis.
Na minha terra (Serpa) os tarros de cortiça não eram muito usados, que eu me lembre já se tinha passado à fase da marmita.
Cucharros sim havia-os e em abundância até em casa, normalmente atados com uma guita às "enfusas" de barro.